O ICMS nas importações por conta e ordem e por encomenda: leitura prática do ARE 665.134/MG julgado pelo STF em sede de repercussão geral
Foi publicada em 19 de maio de 2020, a íntegra do acórdão em ARE 665.134/MG, em que se discute o critério para definição do Estado competente para cobrar o ICMS-importação, especialmente em operações envolvendo mais de um destinatário do bem importado (jurídico, físico e econômico, por exemplo), cada qual estabelecido em uma unidade distinta da federação.
O assunto tomou especial relevância na mídia nas últimas semanas, após notícia divulgada pelo Valor Econômico indicar os reflexos deste julgamento para as importações por conta e ordem e por encomenda, as duas modalidades de importação mais praticadas no país e que motivam disputas acirradas pelo ICMS, segundo a nota; mostrando-se oportuna, portanto, a apresentação de esclarecimentos jurídicos sobre o tema, diante de sua pertinências para as decisões estratégicas e operacionais dos clientes importadores.
O assunto objeto da discussão no recurso envolvia importação de matéria-prima para industrialização por estabelecimento mineiro, desembaraçada por estabelecimento paulista que era também o destinatário do produto acabado, para posterior comercialização. Em face do conflito de competência entre os Estados de Minas Gerais e São Paulo – pois ambos consideravam seus contribuintes destinatários da importação e exigiam para si o ICMS-importação – a celeuma chegou ao STF, que decidiu pela sujeição ativa do Estado de Minas Gerais na hipótese tratada. Em resumo, reconhecendo a legalidade da circulação ficta de mercadoria derivada de uma operação documental ou simbólica, quando existente efetivo negócio jurídico, o Tribunal afastou o entendimento de que o local da operação seria apenas o da entrada física do bem importado, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável pelo tributo.
Decidido o recurso, o Supremo fixou a seguinte tese, em sede de repercussão geral (Tema 520): “O sujeito ativo da obrigação tributária de ICMS incidente sobre mercadoria importada é o Estado-membro no qual está domiciliado ou estabelecido o destinatário legal da operação que deu causa à circulação da mercadoria, com a transferência de domínio”.
Embora a matéria objeto do recurso examinado não tenha relação direta com a importação por conta e ordem ou por encomenda, o Tribunal traçou suas considerações e diretrizes interpretativas sobre a sujeição ativa do ICMS nas referidas modalidades de importação indireta, indicando que (i) o destinatário legal na importação por conta e ordem é o adquirente, (ii) na importação por encomenda, o importador (trading company), e que o sujeito ativo do ICMS-importação é o Estado em que domiciliados, conforme item destacado da ementa do acórdão:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. DIREITO TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS – ICMS. IMPORTAÇÃO. ART. 155, §2o, IX, “A”, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ART. 11, I, “D” E “E”, DA LEI COMPLEMENTAR 87/96. ASPECTO PESSOAL DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA. DESTINATÁRIO LEGAL DA MERCADORIA. DOMICÍLIO. ESTABELECIMENTO. TRANSFERÊNCIA DE DOMÍNIO. IMPORTAÇÃO POR CONTA PRÓPRIA. IMPORTAÇÃO POR CONTA E ORDEM DE TERCEIRO. IMPORTAÇÃO POR CONTA PRÓPRIA, SOB ENCOMENDA.
[…]
4. Pela tese fixada, são os destinatários legais das operações, em cada hipótese de importação, as seguintes pessoas jurídicas: a) na importação por conta própria, a destinatária econômica coincide com a jurídica, uma vez que a importadora utiliza a mercadoria em sua cadeia produtiva; b) na importação por conta e ordem de terceiro, a destinatária jurídica é quem dá causa efetiva à operação de importação, ou seja, a parte contratante de prestação de serviço consistente na realização de despacho aduaneiro de mercadoria, em nome próprio, por parte da importadora contratada; c) na importação por conta própria, sob encomenda, a destinatária jurídica é a sociedade empresária importadora (trading company), pois é quem incorre no fato gerador do ICMS com o fito de posterior revenda, ainda que mediante acerto prévio, após o processo de internalização. […] (STF – ARE 665.134/MG, Rel. Min. Edson Fachin, DJE 19/05/2020)
Resumindo a termos práticos, de acordo com a recente decisão do Supremo, o ICMS-importação será devido (i) ao Estado do adquirente da mercadoria, nas importações por conta e ordem e, (ii) ao Estado do importador (trading company) nas importações por encomenda.
Registra-se, por fim, que os motivos determinantes da decisão em sede de repercussão geral do STF, nos quais se incluem as considerações e diretrizes interpretativas acerca da sujeição ativa do ICMS na importação por conta e ordem e por encomenda, embora não dotados de força vinculante (restrita à tese firmada e no dispositivo da decisão, de acordo com a atual jurisprudência), são relevantes na medida em que indicam o posicionamento do Tribunal sobre a matéria e certamente fortalecem qualquer defesa ou pleito dos contribuintes importadores.
Informação emitida dia 21 de maio de 2020