22/09/2021

Caso Evergrande: como o calote de uma empresa chinesa pode afetar os mercados globais?

Efeito borboleta: uma lepidoptera bate as asas para alçar voo numa floresta na Amazônia e causa um tornado no Texas.

 

Muitos recorreram a essa famosa metáfora da teoria do caos para ilustrar o que aconteceu nos mercados de todo o mundo no começo desta semana. No dia de 20 de setembro de 2021, as bolsas mundiais de ações despencaram – incluindo a Ibovespa –, ante o receio de que uma empresa chinesa deixasse de cumprir suas obrigações financeiras.

 

Trata-se da Evergrande Real Estate, uma gigante do setor imobiliário na China fundada em 1996, segunda maior empresa do ramo no país e 122.ª maior do mundo em receita, de acordo com a lista Fortune Global 500 de 2021. Sediada na província de Guangdong, a Evergrande vende apartamentos para moradores de renda alta e média e é responsável por mais de 1,3 mil projetos imobiliários em 280 cidades. O seu passivo é de R$ 1,89 trilhão, e a empresa usa esse seu tamanho para se endividar, comprar terrenos, insumos e continuar crescendo.

 

Assim, entre bônus e empréstimos, a dívida da empresa soma cerca de R$ 466 bilhões, número que é maior do que o Produto Interno Bruto (PIB) da Argentina em 2020! Depois de alguns pagamentos de juros não terem sido feitos pela empresa na fatídica segunda-feira, os mercados reagiram com grande preocupação. Foi estimado que cerca de 1 milhão e 500 mil clientes poderiam perder depósitos em casas da Evergrande que ainda não foram construídas, se a empresa realmente falir.

 

O caso seria um exemplo de como, em um mundo hiperconectado, pequenas alterações – neste caso, uma incorporadora com atuação local – acabam dando origem a fenômenos de grande magnitude – o tal efeito borboleta que mencionamos de início. Mas quais são as possíveis reais consequências do caso para os mercados globais? Veremos uma repetição da crise imobiliária de 2008? No que os investidores no comércio exterior precisam ficar de olho?

 

Continua a leitura que a gente responde a essas perguntas na sequência!

 

Entenda os riscos

Não é novidade para ninguém que, hoje em dia, vivemos em um mundo globalizado, em que fenômenos locais se repercutem por todo o sistema, de formas por vezes até inesperadas.

 

Neste caso, o receio é que os fornecedores e os bancos ligados à Evergrande Real Estate sejam afetados por um possível calote da empresa e que os fundos que investiam nela também acabem sofrendo com o efeito cascata. Mas não seria só isso.

 

As consequências para o setor imobiliário chinês fizeram com que os preços do minério de ferro despencassem na China em quase 9% e, pela primeira vez em um ano, o insumo foi comercializado abaixo dos US$ 100. A economia chinesa é a maior importadora mundial de minério de ferro. Empresas brasileiras como a mineradora Vale caíram bastante na bolsa de valores de São Paulo, ajudando o Ibovespa a despencar.

 

Como a maior parte da dívida da Evergrande é em moeda local (yuan), uma falência da empresa pode gerar um efeito cascata com redução interna da demanda. Sendo a China um grande player no comércio internacional, em termos de importação e exportação, o mundo inteiro seria afetado. E para o Brasil, as consequências seriam particularmente significativas.

 

De acordo com dados compilados pela Fundação Getulio Vargas, somente em 2021, a China comprou 63% das vendas externas de minério de ferro do Brasil, 69% da nossa soja em grão e 49% do petróleo. O gigante asiático também abocanhou elevada participação nas compras da nossa carne bovina (57%) e celulose (42%).

 

Isso tudo que acabamos de listar, de fato, acende o alarme para o que aconteceu em setembro de 2008, que alguns analistas descrevem como “hecatombe financeira internacional”. Na altura, o banco americano Lehman Brothers decretou falência, depois de reconhecer a insolvência de créditos imobiliários. Sem receber socorro do Federal Reserve (ou Fed, o banco central dos Estados Unidos), gerou-se um efeito dominó de perdas em instituições financeiras pelo mundo afora que resultou em uma grave crise.

 

Cenários bem diferentes

Especialistas têm sido cautelosos em relação a previsões catastrofistas. Isso porque os cenários são bem diferentes em relação a 2008.

 

Explicamos

A Evergrande Real Estate desempenha um papel estratégico em projetos de longo prazo que buscam o desenvolvimento econômico da China. A empresa é responsável por empreendimentos em cidades de baixa renda e gera quase 4 milhões de empregos (diretos e indiretos) por ano.

 

Então, além do efeito econômico local e global, o governo chinês teme um efeito social considerável resultante de uma possível falência da gigante imobiliária.

 

Tudo isso deve fazer com que, diferentemente do Fed, os bancos estatais chineses intervenham neste caso. O governo do Partido Comunista tem uma forte capacidade de interferência na gestão dos ativos (WMPs ou Wealth Management Products) que integram uma boa parte da dívida da Evergrande.

 

Assim, a expectativa para que isso aconteça é muito grande. O governo deve promover a reestruturação da companhia, via venda de ativos, limitando as perdas. De forma curta e grossa, as autoridades chinesas “têm bala na agulha para garantir a liquidez do sistema, não importa o tamanho do buraco”, como afirmou Rodrigo Zeidan, professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral em artigo recente na Folha de São Paulo.

 

O que ficar de olho

Em 20 de setembro de 2021, é verdade que as ações da Evergrande caíram 19% em Hong Kong, mas elas logo se recuperaram parcialmente para 10,2% no fechamento do pregão.

 

No dia seguinte, 21 de setembro, o Ibovespa fechou em alta de 1,29%, a 110.249 pontos, e o dólar caiu 0,86%, cotado a R$ 5,2860. Nos Estados Unidos, as principais bolsas fecharam próximas da estabilidade.

 

Então, claro, é importante ficar de olho nas cenas dos próximos capítulos, especialmente considerando os impactos no comércio exterior. Mas, passando o susto e o pânico iniciais, ao que tudo indica, os cenários mais catastrofistas não são, felizmente, os mais realistas!

 

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